Insurreição de Queimado completa 170 anos nesta terça
É hoje (19) a comemoração dos 170 anos da Insurreição de Queimado, principal movimento contra a escravidão no Espírito Santo. No último final de semana, foi realizada a 9 ª caminhada noturna dos Zumbis Contemporâneos, que já é uma tradição em homenagem à data.
E há mais motivos para comemorar quando o assunto é Queimado. O sítio histórico vai se transformar em um verdadeiro museu a céu aberto. A restauração foi viabilizada por meio de um Acordo de Cooperação Técnica e Financeira entre o município e o Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Espírito Santo (Sincades), no valor de, aproximadamente, R$ 1,3 milhão.
“Palco de uma insurreição de escravos liderada pelos heróis Chico Prego, João da Viúva e Elisiário, em 1849, o local foi tombado pelo Conselho Estadual de Cultura em 1993. Agora, com a restauração das ruínas, queremos transformar Queimado em um museu a céu aberto, onde as pessoas possam conhecer a história de luta do povo serrano”, conta o prefeito da Serra, Audifax Barcelos.
Saiba mais:
O dia 19 de março de 1849 é um dos mais significativos do calendário da cultura negra. Nesta data, aconteceu a Insurreição do Queimado, esse emblemático episódio da história afro-brasileira. E apesar dos escassos registros sobre o assunto, a data é lembrada e celebrada, principalmente, no Estado do Espírito Santo, onde ocorreu o grito de liberdade dos negros escravizados.
Principal movimento contra a escravidão ocorrido no Espírito Santo, a Insurreição do Queimado é resultado da construção de um processo político de conquistas e foi um marco na história da negritude capixaba. Contam os pesquisadores que a revolta nasceu de uma promessa não concretizada de liberdade, feita pelo frei italiano Gregório José Maria de Bene aos escravos da localidade de São José do Queimado, hoje distrito do município de Serra.
ESTOPIM – Tido como defensor dos ideais de liberdade, o missionário tinha interesses políticos em construir uma igreja na região, e teria garantido a negociação da alforria com os donos de fazendas, em troca da construção do templo pelos escravos. Há relatos de que o frei não teria garantido nada, e, sim, prometido interceder junto aos fazendeiros para obter a concessão da alforria. Consta, ainda, que ele realmente não admitia a escravidão e que teria estabelecido uma estreita ligação com os escravos, o que preocupava e contrariava quem usava a mão de obra escrava para enriquecer.
O fato é que o não cumprimento do que fora interpretado como uma promessa deflagrou uma rebelião. Relatos de descendentes dos sobreviventes apontam que mais de 300 homens, mulheres e até crianças manifestaram o inconformismo – afinal, a igreja fora entregue pronta antes do dia de São José, conforme combinado, e resultara de muito tempo de árduo trabalho. Conta-se, também, que o templo foi construído com pedras divididas por tamanhos, e carregadas por longas distâncias e subidas íngremes; as pedras pequenas, do tamanho de um punho, eram destinadas às crianças, algumas com apenas seis anos de idade.
VIOLÊNCIA – O movimento foi caracterizado por extrema violência, especialmente na contenção, por parte da Polícia da Província, e durou cinco dias, até a prisão de seu principal líder, Eliziário Rangel. A maioria dos escravos foi brutalmente assassinada e seus corpos jogados na hoje chamada “Lagoa das Almas”.
Alguns sobreviventes foram para o município de Cariacica, onde fundaram o Quilombo de Rosa d’ Água. Além de Eliziário, os outros líderes foram Francisco de São José (o “Chico Prego”) e João Monteiro (o “João da Viúva”). Chico Prego e João da Viúva foram enforcados, mas Eliziário protagonizou uma lendária fuga – saiu pela porta da cela deixada aberta –, no que foi considerado pelos escravos como um milagre atribuído a Nossa Senhora da Penha, padroeira do Espírito Santo. Na verdade, o carcereiro, penalizado com os maus tratos impostos aos negros, confessou, depois, ter facilitado a fuga.
Elisiário tornou-se uma lenda para os negros que sonhavam com a liberdade, e foi alcunhado como o “Zumbi da Serra”, em alusão ao herói do Quilombo dos Palmares. Chico Prego ganhou estátua em uma praça no município da Serra, e seu nome batiza a Lei Municipal de Incentivo à Cultura.
fonte 1: Prefeitura Municipal da Serra, Gabrielle Tallon
fonte 2: Fundação Cultural Palmeres, Jaqueline Freitas